Por Arthur Franco e Carlos Gabriel F.
O facebook vem sendo palco constante de um duelo que já dura
algum tempo. De um lado, os fãs de Harry Potter, com varinhas e críticas em
punho, defendendo com unhas, dentes e feitiços a saga criada por J. K. Rowling.
Batendo de frente, estão os fãs de Crepúsculo, passando por cima de tudo e de
todos para colocarem a história do triângulo Bella-Edward-Jacob no lugar de
melhor livro de fantasia já escrito.
As duas obras são estrondosos sucessos que levam acalorados
fãs aos lançamentos dos filmes e criam filas imensas nas estréias das
adaptações cinematográficas. Ambas já ganharam diversos prêmios e abarrotaram
as contas bancárias de suas autoras, tudo graças aos leitores que fazem de tudo
pelos seus heróis.
Fãs de todo o mundo compartilham fotos que pronunciam que o
triângulo Harry-Rony-Hermione “nunca chegará aos pés” do triângulo formado
pelos protagonistas de Crepúsculo (ou vice e versa). Além disso, Stephen King
deu recentemente uma declaração que só deu mais força ao duelo. O autor disse à
revista USA Weekend que a principal diferença entre J. K. Rowling e Stephenie Meyer
é que a primeira é uma ótima escritora, enquanto Meyer “não consegue escrever
nada”. Outra citação atribuída a King que anda circulando pela internet é que “J.K.
Rowling escreveu em um capítulo uma história de amor melhor que Stephenie Meyer
fez em quatro livros”. Verídica ou não, é fato que desperta nos fãs das duas
histórias uma tendência à confrontação.
Mas qual o porquê desse embate? Os livros são assim tão
parecidos que não podem coexistir na mesma estante? Não é possível gostar das
duas sagas? Esse parece ser o pensamento de alguns fãs, mas vamos aos
argumentos.
Harry Potter foi primeiramente lançado em 1997. Pode-se
dizer com certeza que a série é um fenômeno dos últimos anos, arrecadando
milhões de dólares tanto nas vendas dos livros quanto de produtos baseados na
saga, como filmes, videogames, roupas, itens de colecionador e até outros
livros que abordam o universo mágico de HP. Contando com sete volumes, a
história gira em torno de Harry, um órfão que mora com seus tios abomináveis.
Prestes a fazer 11 anos, Harry recebe a inesperada visita de Rúbeo Hagrid,
guardião das Chaves e dos Terrenos de Hogwarts, e descobre que é bruxo. Na
mesma noite ainda, Harry descobre que seus pais não morreram em um acidente de
carro, mas foram mortos pelo maior bruxo das trevas de todos os tempos: Lord
Voldemort. É em torno desse conflito que toda a série vai se desenvolver, na
eterna luta do bem contra o mal, da justiça contra o erro, do certo versus o
errado.
Já Crepúsculo tem a sua temática baseada em uma história de
amor “impossível”. Lançado em 2005, o livro também se tornou um imediato
sucesso, sendo seguido de filmes, jogos, roupas e livros derivados da saga. São
no total quatro livros que narram a história de Bella, uma humana que se
apaixona pelo misterioso e pálido Edward. As circunstâncias acabam por
deixá-los cada vez mais próximos, até Bella descobrir pelo seu amigo Jacob que
Edward é um vampiro, mas que não se alimenta de sangue humano. Ao longo dos
livros, a personagem principal também descobre que Jacob é um lobisomem,
inimigo natural dos vampiros. A partir daí surgem os conflitos, já que Bella
esta perdidamente apaixonada por Edward, mas nutre sentimentos por Jacob.
As duas obras possuem diversos pontos em comum, mas também
se diferenciam bastante em certos aspectos. O principal em comum é o universo
fantástico e mágico em que as histórias se desenvolvem. Harry Potter é um livro
carregado de mitologia, em que bruxos, centauros, sereias e outros seres
mágicos se misturam e interagem. Crepúsculo também é assim, permeado por
vampiros e lobisomens. Os dois livros jogam com seres que estão no imaginário
popular há séculos já, mas ambos dão um ponto de vista diferente da cultura tradicional
de bruxos e vampiros. Harry não faz encontros secretos na floresta para adorar
a lua e Edward não bebe sangue humano. Além disso, nem todos os personagens dos
dois livros são dotados de poderes, então a maioria da humanidade desconhece a
existência dessas criaturas mágicas.
O segundo ponto em comum é que ambas as obras foram escritas
para um público juvenil. Evidentemente, depois de lançados e ficaram
conhecidos, leitores de todas as idades se interessam pelas histórias. As
temáticas de vida escolar, magia, amizade, luta do bem contra o mal (HP) e
virgindade, adolescência, romance, primeira vez no sexo (Crepúsculo) são
voltadas, primeiramente, para o público adolescente.
Outra semelhança é o triângulo que aparece nos dois livros. A
série Harry Potter é focado no triângulo Harry-Ron-Hermione, enquanto
Crepúsculo tem Bella-Edward-Jacob como protagonistas. Mas as semelhanças nesse
aspecto param por aqui. Somente a composição dos personagens principais que é
igual. Vejamos o que os livros têm de diferenças.
Pode-se pensar que a escolha de um triângulo de personagens
como protagonistas foi pensada no sentido romântico, para que consequentemente exista
um conflito de interesses. Isso realmente ocorre em Crepúsculo, mas não existe
em HP. Bella se apaixona por Edward, de uma forma quase insana, mas fica em
dúvida dos seus sentimentos quando se aproxima de Jacob. E é essa tensão
amorosa-sexual que desenvolve a história (além do amor de Bella por Edward). Outros
pontos, como conflitos entre vampiros e virgindade, também são abordados, mas
ficam em segundo plano. Já em HP, o triangulo principal não tem um “quê” de
amor. Em nenhum momento do livro é colocado que Harry se apaixona por Hermione.
Ela desenvolve sentimentos por Rony, que culminam no casamento do casal no fim
da saga, mas é somente esse o romance que envolve os personagens principais
enquanto triângulo. Harry se envolve amorosamente com outras personagens, mas
que estão em segundo plano.
O foco dado às histórias também é totalmente díspare. Crepúsculo se foca, quase que em todos os 4
livros, e de forma intensa e única, no amor de Bella e Edward e de como esse
romance afeta a vida dos dois. Afinal, Edward é um vampiro imortal e Bella é
uma simples jovem que não viverá para sempre. Como os dois podem possivelmente
ficar juntos sem que Bella seja mordida e vire uma vampira, ganhando assim a
vida eterna? O romance (ainda que meloso) é combustível da história. Em HP o
quesito romance fica em segundo plano, com o amor de Harry e Gina ou de Rony e
Hermione. O que J. K. Rowling prioriza, em detrimento do amor, é a amizade, os
benefícios de ter amigos e o que a falta deles pode causar.
O motor do enredo em HP é a eterna luta do bem contra o mal.
Harry e Voldemort estão em conflito da primeira a última página da saga e tudo
culmina para que a bondade, o que é certo vença a representação da maldade,
mesmo com muitos empecilhos e dificuldade nesse percurso. Em Crepúsculo essa
luta é quase inexistente. Podemos dizer que Edward simboliza o bem, uma vez que
não bebe sangue humano, mas o mal tem poucas representações durante a
saga.
Uma última característica que se encontra em divergência nas duas obras é como a história é narrada e suas diferentes perspectivas. Enquanto J. K. opta pelo uso da terceira pessoa do singular, de modo a descrever fatos num espaço em que é onisciente e observadora, Meyer, por sua vez, escolhe como narradora a própria personagem, tornando-a em seu eu-lírico ali submetido. No primeiro caso possibilita-se um relato dos acontecimentos além dos protagonistas, já que o enredo se adensa em outros aspectos, enquanto, no segundo, prioriza-se apenas a visão da personagem em questão, tramando apenas o que está ao alcance de sua percepção.
Depois da avaliação das duas séries, é possível ver que,
apesar de serem histórias de fantasias, ambientadas em um universo mágico e em
que os protagonistas são criaturas mitológicas da cultura popular, os livros
não são assim tão parecidos. Podem, e devem, sim coexistir na mesma estante.
São livros bem escritos e cativantes, cada um no seu modo e com a sua história.
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