sexta-feira, 6 de julho de 2012

Cicatriz não curada.


Por Carlos Gabriel F.

Alguns livros me causam uma dor tão tremenda, uma inquietação na alma por tamanha desavença, que me causam choro ao rememorar o que foi lido, datilografado e não mudado. O primeiro livro ficcional de Paulo Henriques Britto – que conheci em etapas vestibulares e que não, não tem nada a ver com a película recentemente produzida por Marcos Prado –, “Paraísos Artificiais”, encaixa-se perfeitamente nesta condição característica de cicatriz não curada.


“Você esta sentado numa cadeira. Você está sentado nesta cadeira já faz bastante tempo. Você fica sentado nesta cadeira durante muito tempo, diariamente. Você não conseguiria ficar parado em pé por tanto tempo; logo você ficaria cansado, com dor nas pernas. Também não conseguiria permanecer tanto tempo assim deitado na cama, de cara para o teto; (...) basta sentar-se na cadeira, pegar um lápis e uma folha de papel, e começar a escrever”.

O autor, com suas palavras duras e de concisão, traça uma linha de retrospecto tão subjetivo em seu âmago que, por vezes, faz-se de difícil entendimento perante um leitor de inocência em êxtase. O livro é dividido em nove contos, que são: “Os paraísos artificiais”, “Uma doença”, “Uma visita”, “Um criminoso”, “O companheiro de quarto, “Coisa de família”, “O 921”, “O primo” e “Os sonetos negros” – que narram histórias diversas: desde um observador insone que observa o movimento de sua rua; ou um encontro familiar que se faz como um ritual de humilhação; ou um diário que narra a descoberta de um enigma.

O universo de Paulo é flexível, mas com situações extremas e (des)encontros estranhos, em que o protagonista vê-se diante si mesmo e em conflito com a imagem que vê em reflexo. A dor de seu tema se faz presente em finais inviáveis; em contos tão grandiosos que o desfecho paradisíaco em firmeza é impossível de ser dado intelectualmente. 

“Depois saio do quarto, fecho a porta cuidadosamente, vou até a sala, abro a janela, respiro fundo. Uma frase besta aparece a toda hora na minha cabeça: amanhã é outro dia. Claro que amanhã é outro dia, porra”.

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